21 dezembro, 2004

Big Brother na Big City

Há muitos anos li o interessantíssimo e fundamental "1984", obra de George Orwell, pseudônimo do autor inglês Eric Arthur Blair (1903-1950), nascido nas Índias britânicas, de mãe de ascendência francesa e pai inglês. O Mundo Cultural assim apresenta Orwell e resume seu romance "profético":
Começou a escrever sob o pseudônimo de George Orwell e sempre se pareceu mais com os heróis de seus romances que com os muitos rótulos com que tentaram catalogá-lo ao longo de sua vida. Ferrenho ativista a favor da liberdade e da justiça, lutou na Guerra Civil Espanhola, onde assistiu à derrota do POUM (Partido Operário de Unificação Marxista) e começou a desiludir-se com o stalinismo. Dedicou seus últimos anos de vida a denunciar o papel do Estado no aniquilamento das liberdades individuais e da cidadania. É considerado o mais influente escritor político do século XX, a ponto de hoje o termo “orwelliano” ter-se consagrado como adjetivo, caracterizando o que tem aspecto totalitário e falsificador na História.
A obra retrata o mundo dividido em três grandes superestados: Eurásia, Lestásia e Oceania. Em uma ou outra aliança, esses três superestados estão em guerra permanente. O objetivo da guerra, contudo, não é vencer o inimigo nem lutar por uma causa,
mas manter o poder do grupo dominante.
O enredo, sob a perspectiva de Oceania, mostra como teletelas permitem que o chefe supremo do Partido, o Grande Irmão – o Big Brother no original inglês –, vigie os indivíduos e mantenha um sistema político cuja coesão interna é obtida não só pela opressão, mas também pela construção de um idioma totalitário, a Novilíngua, que, quando estivesse completo, impediria a expressão de qualquer opinião contrária ao Partido.
Em todas as casas e edifícios, havia teletelas, através das quais o Grande Irmão vigiava todos os cidadãos.
Embora em circunstâncias diferentes daquelas prenunciadas por George Orwell, é impossível não associar sua "premonição" com o que está a acontecer nas grandes metrópoles e, recentemente, em nossa Belo Horizonte: acabam de ser instaladas mais de 90 câmeras de TV no hipercentro, vigiando os transeuntes por 24 h. A polícia, pelos monitores, tem a possibilidade de dirigir o foco para qualquer indivíduo "suspeito", com a aproximação impressionante proporcionada pelas câmeras com zoom de 200 vezes! Ou seja, dá prá conferir até a cor de seus olhos. O que me faz recordar os lembretes pendurados até nos banheiros de minha escola primária (lá se vão alguns anos): "Deus me vê". Não dava prá pecar nem em pensamento!
Dados oficiais apuram que os índices de criminalidade (furtos) se reduziram em 40% e uma dúzia meliantes foram presos em flagrante somente nas duas últimas semanas!
Belo Horizonte virou um imenso "big brother". Não aquele global, desempenhado por caçadores da grande chance, mas o big brother urbano, no qual todos participamos.
Nos elevadores do prédio onde trabalho já sou vigiado por câmeras e os porteiros sabem quando ajeito o cabelo ou coço o saco. Nas lojas, sorrio sempre, conforme mandam os avisos: "Sorria, você está sendo filmado!"
Agora, para um passeio pelas calçadas, tenho de caprichar no visual e na atitude, pois o risco de ser "suspeito" pode causar confusões: "Teje preso! O que o senhor está fazendo olhando insistentemente para a vitrine da joalheria?" Lá vou eu ter de explicar que não tenho más intenções...
Eis o preço da modernidade, da insegurança geral, da desigualdade, da decadência dos valores, da necessidade de controle!
Você aí, cuidado! Evite atitudes suspeitas! Caso queira cometer um delito, faça-o na periferia ou eleja-se deputado, vereador, prefeito!