31 agosto, 2008

Périplo ou odisséia?

Périplo - s.m. (a1858 cf. MS6) 1 viagem de circunavegação em torno de um país, de um continente 2 fig. viagem turística de longa duração 3 (a1858) p.ext. relato dessas viagens ¤ etim gr. períploos ou períplous,ou 'circunavegação', perí- 'em torno de' e plóos,ou 'navegação', pelo lat. perìplus,i 'id.' [Houaiss].
Odisséia - s.f. (1873 cf. DV) 1 longa perambulação ou viagem marcada por aventuras, eventos imprevistos e singulares 2 narração de viagem cheia de aventuras singulares e inesperadas 3 travessia ou investigação de caráter intelectual ou espiritual
[Houaiss]

De repente, surgiu o convite do mano Boni para festa de 15 anos de casamento com a Cida que, por sua vez, comemoraria aniversário. Além disso, ir a Nova Era tem sabor de encontro de família, rever os meus pais e outro irmão que moram por lá.
Juntamos mala e cuia e saímos daqui de BH às 16,50h de sábado, com tempo de sobra. Éramos: Amélia, eu, nosso filho Ângelo & a namorada Renatinha.
Foi o início comum de uma longa viagem.

Sair de Belo Horizonte em direção ao Vale do Aço (nome da região por causa das grandes metalúrgicas Arcelor/Belgo-Mineira, Acesita e Usiminas) requer paciência e cuidado para enfrentar uma estrada saturada, com traçado absolutamente maluco, abarrotada de caminhões, ônibus e automóveis. Trata-se da 'rodovia da morte'. Sei que quase todas são "de morte", mas a BR262/381 ganha com muitos corpos de vantagem (argh! que coisa horrível este trocadilho!).

Tudo corria bem, exceto o trânsito que se arrastava, como sempre. Entardeceu e começou uma ventania fortíssima. Há três meses sem chuva, pequenos galhos e miríades de folhas (sempre quis usar essa palavra) rodopiavam à luz dos faróis. Antes que acabasse de falar Vai chover, a tempestade desabou. Mal e mal vislumbrava o farolete do veículo à frente, o olho-de-gato que divide as pistas, mais nada. Assim dirigi por 1 hora inteira, palmo a palmo vencendo chuva, enxurrada, (in)visibilidade, tensão. Éramos quatro pares de olhos, cada par tentando adivinhar o que havia 30 cm à frente: Devagar! Olha, o carro ali freou! Aquele ali saiu da pista! Ó o caminhão! Vamos parar?

Dentro do carro era muita tensão, medo, sensação de extremo perigo. Às margens da rodovia, carros parados, alguns com as rodas dentro das valetas, impossibilitados de continuar viagem... Amélia e Renatinha contavam casos engraçados, riam, mas era nervosismo puro. Chegaram a rezar. Entretanto, não havia como sair daquela situação: trânsito à frente e atrás, uma fila indiana da qual só se viam as lanternas da frente e o farol no retrovisor.

Paramos. Ou melhor: tudo parou, a fila de luzinhas vermelhas, pisca-pisca piscando. Stop! a vida parou ou foi o automóvel?, poetou, um dia, Carlos Drummond de Andrade. [Cota Zero, Alguma Poesia, 1930]. Parou tudo, mesmo. Estávamos no contorno de João Monlevade, próximos a um posto da PRF; dei meia volta e fui lá saber do guarda o que estava acontecendo. Explicou: uma árvore caiu lá na frente, fechou a estrada. Não há previsão de liberar, pois estamos sem energia elétrica e não dá pra chamar ajuda. Pergunto: E por dentro de Monlevade, dá prá passar? Ele: Lá está tranquilo. Nós: Então vamos!

Ledo engano! [Fala aí, professor, o que é ledo? "Ledo" vem do latim 'letus', que significa alegre. Daí 'Letícia", que significa alegria. Ah, bom, continuemos.] A alegria durou pouco, pois a entrada para a cidade estava inundada. Mas um chevettinho passou, porque não passaríamos? Pisei fundo e seguimos em frente. Dentro da cidade a avenida principal estava quase intransitável.

Próximo à usina fomos envolvidos pela neblina, um
fog intenso, apesar de Londres estar do outro lado do oceano. Os alagamentos eram numerosos. Avaliávamos o risco, engatávamos uma segunda marcha, acelerávamos com determinação e ganhávamos mais uns metros à frente.

Em Bela Vista de Minas, o caos: uma chuva de granizo cobriu o asfalto. Deslizamos numa ladeira mas, graças ao
empurrãozinho do Ângelo e à perícia do condutor (este humilde servo que vos fala) vencemos os obstáculos, com denodo e arte.
[Que isso, professor? Uai, procura no Houaiss e você vai achar:
denodo: /ô/ s.m. (sXIV cf. IVPM) 1 ousadia, bravura diante do perigo; intrepidez, coragem 2 p.ext. atitude arrojada e irrefletida; precipitação, afoiteza 3 p.ext. agilidade na ação; desembaraço, soltura, desenvoltura 4 fig. procedimento nobre e valoroso; brio, distinção. Nossa! Que exagero!]

Br262/381, em Bela Vista de Minas-MG, coberta de gelo. Foto by Cláudio Costa.

Pra encurtar tamanha prosopopéia, digo logo que chegamos mais de 4 horas após o início de uma viagem prevista para a metade do tempo. A festa estava ótima, ainda deu tempo de abraços, conversas, comes e bebes.

Hoje, 10,30h, pé na estrada. Vamos voltar cedo, que o trânsito deve estar bom, almoçamos em Belorizonte, meio dia a gente tá chegando em casa. Ângelo e Renatinha teriam um compromisso às 14h. Mais tarde, uma festa de aniversário. A gente queria descansar. Então, vamos!

Na descida da Serra de São Gonçalo, um caminhão baú tombara fora da estrada, à beira do abismo. Passamos devagar, porém aliviados por não haver retenção do tráfego. Se continuar assim, chegaremos antes das 13h, exclamei.

Subíamos um trecho sinuoso, cercado de eucaliptos, contando as 11 curvas fechadas para a direita e esquerda. Na quinta curva, a 50km da capital, encontramos tudo parado. Até quando?

Sinalizo para um motoqueiro solitário que desce na pista contrária; ele vem, pára e explica : Uma carreta tombou lá na frente; 4km de engarrafamento, vai demorar!

Fazemos uma mini-assembléia: Esperar? Voltar até um restaurante, almoçar e ver o que vai dar pra ver como é que fica? Dar uma volta de 150km em torno da Serra do Caraça, passar por Barão de Cocais, Santa Bárbara, Sta. Rita Durão, Mariana, Ouro Preto, Itabirito e chegar a BH pela Br 040?

Venceu a última alternativa, a mais complicada, com o forte argumento de podermos almoçar no velho Colégio do Caraça [a comida lá é boa demais, é só uma subidinha à serra, foda-se, vamos passear, turismo é assim, de tardinha a gente chega, tudo é festa quando a alma não é pequena, não existe pecado ao sul do Equador... Chega!].

Resultado: almoço na serra, paradinha em Catas Altas, cruzamento com carreata política em Mariana [Roque já ganhou!], empadinha com guaraná em Cachoeira do Campo, virar à direita na Br040 alí perto de Alphaville, depois o Miguelão, Belvedere, Raja Gabaglia e... casa! Mais tempo de estrada que de festa.

Foi um périplo! Ou seria uma odisséia?



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29 agosto, 2008

Pra não dizer que não falei das flores... para onde foi a política?

Se eu disser que já assisti um pouquinho só a propaganda eleitoral gratuita na tv e que já escutei por uns minutos apenas, talvez muita gente não acredita. Realmente, é dose!
Primeiro, o formato (en)quadrado, determinado pela ditadura militar, que permanece quase inalterado: os candidatos a vereador aparecem por alguns segundos, falam o próprio nome, uma frase de efeito e logo aparece outro, sucessivamente. Os nomes são hilários: Zé Borracha, Tião da Comunidade, Ninico de não sei o quê. Aqui em Belo Horizonte tem até um tal de Maradona!
É ridículo!
Um slogan guardei: Vote em mim: quem chorou vai sorrir! Já estou sorrindo, gargalhando, nunca fui tão feliz (argh!).
Todos prometem fazer o que todos sabem que deveria estar sendo feito desde sempre: melhor qualidade de vida, melhoria no trânsito, melhor educação, melhor distribuição de renda, mais emprego, cidadania (ó palavra enxovalhada!), ambulâncias, pontes, viadutos, escola para todos...
E a política? Onde está a política?
Neca de pitibiribas, não existe política no horário político! Não há nenhum candidato a prefeito que fale de política, ideologia, nada disso. A oposição não se opõe, a situação vê tudo cor-de-rosa. Uma e outra dizem que farão mais e melhor, mas não dizem uma palavra sequer a respeito da filosofia do partido a que pertencem, porque o ideário deles é melhor, a que princípio obedece o governo atual e porque este princípio é nocivo à população. Não, nada disso. Tudo igual: querem o poder, gastam uma dinheirama que não se sabe de onde vem (dizem que tudo tem origem legítima, está registrado no TRE, não existe caixa dois, dinheiro na mala... talvez nem usem cuecas, os mais honestos).
Nas conversas do dia-a-dia o comentário é sempre em tom de deboche, uns apontando a feiura de tal candidato, outros o baixo nível deles. Quando alguém declara o voto, não sabe bem explicar o motivo. Se começa a falar de motivos políticos, ideológicos, então é alvo de chacota e o papo termina assim:
- Qual o quê, político é tudo igual.
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PS: Outro dia o amigo Idelber Avelar deu uma geral nas eleições. Confira.

15 agosto, 2008

Em breve: mais um empreendimento...

Nas últimas semanas observei movimento de pessoas num terreno próximo ao nosso prédio. Estava todo tomado pelo mato, a ponto de servir de pasto para uns cavalos que pertencem a charreteiros que teimam em trabalhar com recursos de outros tempos.

O bairro tem uma parte baixa e uma parte alta, esta que habitamos. Quem mora em cidades planas não imagina o que é nossa rua: íngreme, muito íngreme. Confesso que nunca a subi a pé!

Belo Horizonte sintetiza, assim, a própria geografia do Estado e suas avenidas percorrem vales onde, antes, corriam riachos e ribeirões. As ruas do plano inicial da cidade foram traçadas a régua e esquadro, ignorando totalmente os acidentes geográficos: algumas são intransitáveis! Entretanto, há certa beleza nessa paisagem acidentada e diversa, que alguns comparam com San Francisco-CA, por exemplo.

O certo é que a especulação imobiliária nunca tem fim e prédios são construídos em locais improváveis, já que os recursos de engenharia atendem ao desejo de se habitar bairros mais centrais.

Pois o nosso bairro, o Gutierrez, é assim: começou no fundo de um vale, atendendo à classe média no final da década de 50. Pouco a pouco evoluiu morro acima, onde terrenos valiosos e novos prédios foram erguidos, alguns até luxuosos.

O movimento no terreno ali ao lado, finalmente, fez sentido: eram agrimensores com seus teodolitos e planilhas. Imaginei: vem mais um prédio, aí.

Finalmente, uma incorporadora, qual conquistadores de outrora, fincou suas bandeiras amarelas no perímetro extenso do quarteirão. Teremos vizinhos:

09 agosto, 2008

Mineirão e Diamantina

1. Hoje é dia de Mineirão: Galo x Grêmio.

O CAM derrotou o Santos, de virada, outro dia. Vantagem? Nem tanto, diante da incompetência do time da Vila Belmiro, na zona de rebaixamento há décadas, quer dizer, semanas. O Galo sassaricou por ali, mas acabou subindo na tabela, não sei se por méritos próprios ou pela ruindade dos demais. Apesar de atleticano, acho que vai dar zebra, hoje: quer dizer, o Galo vence o Grêmio.
[Up date: não deu zebra! Pior: o esquadrão gaúcho saboreou churrasco de galináceo: 4x0.]


Aliás, tá duro assistir aos jogos! De qualquer forma, eu não vou ao estádio, mas deixo aqui duas fotos do palco que será utilizado à tardinha:

Mineirão! Foto by Hugo (meu vizinho, do helicóptero da PMMG)


2. Há uma semana chegamos de Diamantina. Valeu o passeio, um mergulho na região central das Minas Gerais, paisagem áspera palmilhada e descrita por Guimarães Rosa, telhados coloniais, igrejas para todos os santos, Chica da Silva, cristais, tradição das serestas, Vesperata, etc.


Diamantina-MG. Mercado. Foto by Cláudio.



3. Amanhã, comme il faut, almoço com o pai Soié, em Nova Era, cidadezinha que se debruça às margens do Rio Piracicaba, onde até a ponte mandada construir por Getúlio Vargas é atração:


01 agosto, 2008

Serro e Diamantina

Estamos aqui em Diamantina, após uma passadinha no Serro.

São cidades do ciclo do ouro e do diamante, históricas por motivos vários: seja pela riqueza que gerou e foi transferida para Portugal e Inglaterra, seja pelos desmandos dos capitães de escravos e contratadores de garimpeiros, seja pela origem de JK, seja pelo queijo "do Serro", enfim, pela paisagem interessantissima: campos altos da Serra do Espinhaço, que começa com a Serra do Caraça (próximo a Ouro Preto), continua como Serra do Cipó, perto de Jaboticatubas e passa por aqui (hoje vi a nascente do Rio Jequitinhonha) e se estende até à Bahia.
Muita aridez, pedra pra chuchu, cachoeiras, etc.

Ah, tem a casa de Chica da Silva, logo ali. E, em frente, o mercado que foi cenário do filme sobre a Chica. Mais adiante, a casa onde nasceu J.K., o presidente "bossa nova", hehehe

A gente anda pra baixo e pra cima, muita ladeira calçada com pedras escorregadias, lisas pelo tempo.
Igrejas não faltam: ô povo rezador, aquele daquela época.

Muito universitário pelas ruas, ou melhor, pelos botecos: como bebem! Também, a dose de pinga é 0,50 , a garrafa custa R$ 3,50 e o frio é de lascar, pelo menos nessa época.
Amanhã à noite, "Vesperata": músicos ficam a tocar das janelas dos casarões e a gente na rua, escutando, bebendo, namorando.
Terra de Minas, essa. Cada povo com seu uso, cada roca com seu fuso...

E o porta-malas repleto de "queijo do Serro", que ninguém é de ferro.
Segunda-feira voltamos ao trabalho, que a vida não é mole. Mas, por enquanto, nosso endereço é este aqui.