18 novembro, 2004

Mensagem às estátuas

Você já pensou em se imortalizar na pedra, no mármore, no bronze ou no... no... blog???
Frequentemente ouvimos falar da inauguração de uma placa comemorativa ou do busto esculpido de uma personalidade a habitar uma praça ("logradouro público" - segundo a burocracia oficial).
Até os mortos têm, sobre suas tumbas, estátuas tragicamente belas, cinzeladas em mármore negro ou em alvas pedras: "Aqui jaz fulano de tal." Heróis da pátria, beneméritos, políticos orgulhosos de si, cada qual busca a imortalidade pétrea já tentada pelos faraós e suas mirabolantes pirâmides. "Vanitas vanitatum", "Mataiótes mataiotéton", "Vaidade das vaidades"...
Eis que me deparo com um poema de Angel Gonzales, cuja tradução livre deixo aqui:
Mensagem às estátuas
Sei que vocês, pedras,
violentamente deformadas e quebradas
pelo golpe preciso do cinzel,
ainda exibirão durante séculos
o último perfil que representam:
seios indiferentes a um suspiro,
pernas firmes que desconhecem a fadiga,
músculos tensos em inútil esforço,
cabeleiras pétreas que o vento não altera,
olhos abertos que não vêem a luz.
Pois sua imóvel arrogância,
sua fria beleza,
sua desdendosa imutabilidade,
tudo isso acabará, um dia!
O tempo é persistente, tenaz.
A terra também espera por vocês:
Ao pó retornarão. Caídas sob o próprio peso,
haverão de ser cinzas, ruínas, poeira,
quando sua pretensa eternidade nada mais será!
Tornar-se-ão pedras, já que pedras nunca deixaram de ser,
mineral sem vida, puro escombro,
depois de ter vivido por um tempo
ostentando memória de vitórias -
glória vã de algo também dissolvido no esquecimento!