16 junho, 2005

Apontamentos para uma discussão sobre o Amor - I

Passou-se o dia dos Namorados, ficaram para trás os apelos emocionais do comércio, os corações cor-de-rosa já não enfeitam as vitrines. A mídia insistiu em realçar o amor romântico, portanto idealizado. Nos blogs – inclusive neste aqui – muito se escreveu sobre o tema, com declarações de amor, etc.
Daqui a pouco se falará do amor pelo pai (agosto já está próximo), do amor universal (Natal e Ano Novo), amor sexual (carnaval), amor pelo chocolate (!) na Páscoa, pelas mães em maio... o business não pode parar! No fundo, acho que se trata de uma apropriação indevida deste sentimento que chamamos “amor”.

Afinal, que é o amor?

Antes de tudo, trata-se de uma impossibilidade, definir o tema de quase todos os poemas, músicas, teatro, óperas... de quase toda Arte!

Se a Psicanálise freudiana fundamenta os sentimentos de amor (relações de objeto, no jargão freudiano) nas relações libidinais (erotismo, segundo Freud), há outras abordagens possíveis, mesmo entre psicanalistas.
Estudiosos do comportamento buscam mapear as modificações cerebrais desencadeadas por estímulos estímulos excitantes, reduzindo o sentimento amoroso a percepções sutis do odor dos ferormônios e reações bioquímicas intermediadas por neurotransmissores, que seriam vivenciadas pelo sujeito como sentimento amoroso. Ou seja, reduzem o amor a reações biológicas – que existem, é claro.

O pensamento biologicista pode levar ao desprezo da história pessoal de cada um, fundada nas experiências relacionais da primeira infância.
Essas experiências determinam a capacidade de formação de vínculos e se iniciam muito precocemente, quando o bebê não tem capacidade de discernir o que é necessidade e o que virá a ser desejo.

O que importa, nos primeiros anos, é a obtenção de prazer, proporcionado pela estimulação de determinadas zonas corporais, que Freud associou ao desenvolvimento da libido: fase oral, fase anal, fase fálica e genital. Assim, ao prazer obtido primordialmente pela ingestão do alimento (incorporação), segue-se o prazer experimentado pelo controle dos esfíncteres (guardar-soltar) e, finalmente, o prazer vivido com a descoberta dos órgãos genitais que, ainda segundo Freud, evoluirá do auto-erotismo ao erotismo voltado para o outro do sexo oposto.

Tudo isso é muito esquemático. A crítica aponta outro caminho: os destinos do erotismo devem ser desvinculados dos destinos do amor.
Experiências e muita observação demonstram que as primeiras vivências não-eróticas (que não buscam satisfações ligadas às zonas erógenas) se manifestam com o desejo de se agarrar que, por sua vez, se originam no medo de ser largado! Por aí, se deduz que a posição subjetiva inicial do sujeito que ama é uma posição passiva: desejo de ser amado, de ser acolhido: um desejo terno –não libidinal- seria a primeira manifestação espontânea emocional da criança.

Com efeito, deparamo-nos com jovens e adultos que não superaram esta fase, tendo uma vida amorosa marcada pelo medo do abandono, agarramento neurótico, ciúmes doentios. São amantes infantis em sua demanda insaciável, que se mantêm na posição passiva diante daquele a quem demandam:

“Devo ser amado, sempre, em todo lugar, de todas as formas, em todo meu corpo, em todo meu ser – sem nenhuma crítica,
sem o menor esforço de minha parte.”

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[Continuarei depois]