26 fevereiro, 2006

Carnaval em família

Viemos para Nova Era-MG, Amélia, eu e nosso filho Leo para comemoramos, juntos aos familiares, o meu aniversário.

Como sempre, meu pai Soié operou como fotógrafo oficial e folião número 01 de Nova Era (afinal, é homenageado especial da Banda dos Farrapos
).

O almoço foi preparado pela mãezona, Aparecida. Festa & carnaval... com direito a churrasco caprichado pelos manos Bonifácio & Clóvis.


Na cidade, o Carnaval já não é mais como nos velhos tempos - as coisas, afinal, devem permanecer imutáveis?


As lembranças da infância me transportam a tempos idos, quando a serpentina, os confetes e as marchinhas davam o tom de alegria inocente. Pelo menos para aquele garoto de 7-8 anos, a pular pelo salão do pequeno clube, na matinée das crianças. Os frascos de lança-perfume eram vendidos livremente e espalhavam um odor típico, que eu achava delicioso. Ao receber uma borrifada, sentia na pele a mistura de éter geladinho que rápidamente se evaporava. Nunca me passou pela cabeça a possibilidade do uso abusivo que, mais tarde, acarretou a proibição do "perfume de Carnaval".


Nas ruas, foliões quase avulsos se fantasiavam de piratas, palhaços, monstros. Alguns homens se vestiam de mulheres. Um batuque improvisado ou uma bandinha formada de trompete, saxofone, trombone, tarol e tambor completava o "bloco sujo" - como era chamado aquele agrupamento exótico.


Nos anos 70, talvez por influência das transmissões televisionadas dos desfiles do Rio de Janeiro, organizaram-se as "escolas de samba", que chegavam a disputar prêmios e classificações, desfilando nas ruas estreitas provocando aplausos do povão. Formou-se tradição que já está em declínio: ontem à noite passaram algumas alas, sem empolgar. No máximo, acorremos às portas ou janelas dos sobrados.


Mas a "Banda dos Farrapos" e o bloco "Boca de Gole" tentam, ainda, manter a tradição, embora sem o vigor de outrora.

A Banda dos Farrapos se compõe de pseudo-músicos em pseudo-uniformes compostos por velhos e puídos paletós. Desfilam numa bagunça extremamente organizada (!) e com irreverência inocente provocam comerciantes a fornecerem cerveja de graça. O Soié Bar, do meu pai, era parada obrigatória durante anos. Hoje, meu pai Soié é homenageado pelos componentes e recebe, a cada ano, a "camisa" oficial da "corporação".

À noite, domina o "carnaval moderno": Agora, um palco é armado numa rua mais larga e... tome Axé! O som eletrônico derrama aquele baticum imutável sobre a platéia convocada a "assistir" um grupo de rapazes bombados e duas garotas rebolativas em coregografias ensaiadas, provavelmente copiadas de alguns sucessos "baianos" (desculpem os baianos, por quem tenho apreço). Durante a meia-hora que assisti ao "show, junto à Amélia, menininhas de 8 a 10 anos foram convocadas ao palco e disputaram os aplausos do público enquanto "dançavam" miméticamente. Tratava-se de um anacrônico Programa do Chacrinha, animado pelo condutor da "banda" Suingueiros". Os rapazes provocaram "delírios" ao tirarem as camisas...


Melhor foi voltar para a casa dos meus pais, partir a torta de nozes e cantar o "Parabéns pra você".

Enquanto isso, a cidade estatelava-se em frente à TV, "vendo o Carnaval passar".


22 fevereiro, 2006

Ver com os ouvidos

Quando lidamos com pessoas portadoras de completa surdez inata (desde o nascimento), aprendemos que há muitas outras maneiras de "ouvir" o mundo.

São comuns os relatos de hipoacúsicos que descrevem "sensações auditivas" percebidas com outros órgãos do corpo, principalmente pelas sensações vibracionais. Este entrecruzamento de interpretações derivadas dos diversos sentidos do corpo é o que se chama sinestesia. [cf. Houaiss: sinestesia = relação que se verifica espontaneamente (e que varia de acordo com os indivíduos) entre sensações de caráter diverso mas intimamente ligadas na aparência (p.ex., determinado ruído ou som pode evocar uma imagem particular, um cheiro pode evocar uma certa cor etc.); cruzamento de sensações; associação de palavras ou expressões em que ocorre combinação de sensações diferentes numa só impressão].

A cenestesia já é outra propriedade do cérebro em organizar e interpretar as sensações internas do organismo, como por exemplo o sentimento de bem estar ou sensação de relaxamento ou tensão, etc.

Outro tipo de percepção, desta vez relacionada ao próprio peso, movimento, resistência e posição do corpo compõe a cinestesia.

Agora imagine o grau de sensibilidade cenestésica, cinestésica e sinestésica de alguém privado do sentido da audição ou da vista! Para se localizar no mundo, interpretar as alterações sutis do próprio corpo e do meio exterior, os sentidos internos desenvolvem-se espetacularmente.

Por isso os cegos dizem que vêem com outros sentidos: olfato, sensações corporais difusas, alterações mínimas de movimento, etc. Alguns chegam a descrever "cores e volumes": enxergam com os olhos da alma.

Em nós, também, percepções podem desencadear vivências emocionais singulares, originadas em acontecimentos remotos, dos quais não restam lembranças claras, às vezes inconscientes.

O linguajar popular incorporou expressões que utilizamos sem nos dar conta das metáforas (analogias) e metonímias (deslizamento do significado) operadas pela linguagem: voz de taquara rachada; agudo como um estilhaço de cristal, botar a boca no trombone, som aveludado, etc.

Compartilho aqui pequeno trecho da autobiografia de Vladimir Nabokov, autor do célebre e "escandaloso" romance Lolita. Em Speak, Memory!, publicado pela Companhia das Letras sob o título A pessoa em questão (1994), Nabokov nos brinda com uma deliciosa descrição do que é ver com os ouvidos, uma verdadeira audição colorida:

"O longo 'aaa' do alfabeto inglês tem para mim o matiz de madeira desgastada pelo tempo, mas o 'a' francês evoca o ébano polido. Esse grupo preto [de som] inclui o 'g' duro (borracha vulcanizada); e o 'r' (um trapo sujo de fuligem sendo rasgado).
O 'n' de mingau de aveia, o 'l' flácido como macarrão e o espelho de mão com o verso de marfim do 'o' cuidam dos brancos.
Fico desconcertado com o meu 'on' francês, que vejo como as bordas de tensão superficial do álcool em um pequeno vidro.
Passando para o grupo azul, existe o 'x' da nuvem carregada e o 'k' de buckleberry.
Já que existe uma sutil interação entre som e forma, vejo o 'q' mais marrom que o 'k', enquanto o 's' não é o azul-claro do 'c', mas uma curiosa mistura de azul-celeste e madrepérola."

Após ler o parágrafo acima, fiquei tentado a fazer algumas associações entre som e imagem, mas não consegui mais do que o óbvio. Experimentei, entretanto, algo que me pareceu interessante: fechar os olhos enquanto escuto alguém falar ao telefone e construir uma imagem a partir daí. Cada 'coisa' veio na minha cabeça!

Um interlocutor que sibilava muito nos "sss" , sugeriu-me uma serpente. Outra voz me pareceu um céu enluarado. Cheguei a 'visualizar' tartarugas e pedras rolando no fundo de um rio (e não eram os Rolling Stones, garanto!).

Não foi bem a experiência do Nabokov, tão poética e bizarra.
Infelizmente...

21 fevereiro, 2006

OVO DE COLOMBO URUGUAIO

Um engenheiro uruguaio, Armando Regusci, acredita ter encontrado a maneira de fazer seu país economizar US$ 2 milhões diários com a importação de petróleo, além de melhorar o ar das cidades. Ele inventou uma motocicleta que não usa gasolina, nem álcool e nem hidrogênio no motor, mas ar comprimido.
Será o "ovo de Colombo" do transporte sobre rodas?
A engenhoca é simples como colocar um ovo em pé: comprime-se o ar em dois cilindros, regula-se a saída. Com sua força, o ar nosso de cada dia move engrenagens que produzem movimento das rodas.
Pronto: anda-se para um lado e outro, sem queimar óleo, sem poluição: devolve-se ao ar o que é ar...
“Com um motor elétrico ligado à rede pública se comprime ar a alta pressão, por exemplo, 200kg por centímetro quadrado. Com o ar comprimido, nesses depósitos, é possível andar 100 quilômetros a 50km/h", garante o novo Colombo, ou melhor, o velho Regusci.

Preço de uma motoquinha movida a vento encanado: U$ 600, o que dá, pelo Real supervalorizado, a bagatela de 1200 e poucas pílulas.

Problema à vista: ruas e estradas entupidas, cada um montado em seu aerocar, ou motoar, ou bicicletar.

Já pensaram num avião movido a ar, voando no ar? É o supra-sumo da homeostase. Ou seria um pleonasmo?

E mais: se o ar que respiramos virar combustível, vão nos cobrar imposto respiratório, não?

Vem aí a Arbrás: o ar é nosso e ninguém tasca!

[(Fonte: Caderno de Ciência do EM (link para assinantes)].

20 fevereiro, 2006

(DES)HONESTIDADE NOSSA QUE NOS AFLIGE

Brasil:
  • Valor do PIB-2005 + ou - da ordem de 1,6 Trilhão de Reais
  • Economia Informal (não paga impostos) = 700 Milhões de Reais
  • Autuações por sonegação de tributos federais em 2005 = 80 Bilhões de Reais
  • Contrabandos descobertos pela Polícia Federal em 2005 = 601 Milhões de Reais
  • Gastos anuais com a Dívida Pública = 150 Bilhões de Reais
  • Pacote anunciado por Lula para Setor Habitacional = 18 Bilhões de Reais
  • Dados levantados pela CPI dos Correios = Sonegação de 200 Bilhões
  • Prejuízos causados pela pirataria = 30% do PIB
  • Solegação da Previdência Social = 100 Bilhões de Reais
  • Sonegação de Impostos + pirataria + corrupção da previdência + economia informal + juros da dívida pública = 1,8 Trilhão de Reais

Pergunto:
  • Você conhece e já denunciou algum sonegador?
  • Você compra ou já comprou produtos pirateados e ou falsificados?
  • Você já votou em algum candidato que foi denunciado por corrupção?
  • Você já subornou funcionário público para obter alguma vantagem (não ser multado pela Polícia Rodoviária Federal, por exemplo?)
  • Você acredita, realmente, que falta dinheiro ao Governo para consertar estradas, melhorar o acesso à saúde, financiar pesquisas, cuidar do meio ambiente?
  • Você descobriu, pela salada de números acima, que o Brasil, ou seja, nós mesmos, deixamos escapar pelo ralo, a cada ano, um PIB inteirinho?

[PIB = Produto Interno Bruto = Soma de todas as riquezas produzidas no país]

18 fevereiro, 2006

(DES)CULTURA NOSSA QUE NOS AFLIGE

Brasil:
  • 186 milhões de habitantes
  • 20 x a população de Portugal
  • 5,5 x a população da Argentina
  • 3 x a população da França e da Alemanha
  • 55 milhões de estudantes do fundamental à pós-graduação
  • tiragem média de um romance no Brasil: 3 mil exemplares
  • ocupação média dos teatros: 18%
  • público médio dos filmes brasileiros: 600 mil
Pergunto:
  • Quantas vezes você foi ao teatro no ano passado?
  • Quantos filmes (fora os de puro entretenimento) você assistiu?
  • Quais programas "culturais" você acompanha na TV?
  • Quantos romances você leu no ano passado?
  • Quantos livros "não técnicos de sua área" você leu?
  • Quando em viagem de férias, visita museus? Igrejas? Teatros? Bibliotecas?
  • Quantas exposições de arte (pintura, escultura, fotografia) você visitou no ano passado?

17 fevereiro, 2006

Pra falar a verdade...

Um monarca nunca permitia que lhe fizessem o retrato. Finalmente, cedeu aos pedidos do filho para que, antes de falecer, deixasse sua imagem à posteridade. Impôs, entretanto, uma condição: caso não aprovasse a obra, executaria o artista! Três píntores se dispuseram a arriscar o próprio pescoço.



O primeiro retratou o monarca tal e qual, com o narigão enorme e tudo. O rei, diante do quadro, embora admirando o gênio artístico, enfureceu-se com a figura horrenda e mandou enforcar o infeliz artista.


O segundo, apesar de temeroso, pintou o rei fielmente, com exceção do aberrante apêndice nasal, em cujo lugar colocou irrepreensível narizinho. O soberano, sentindo-se ridicularizado, condenou o pintor à pena capital, sem comiseração.


Chegou, a vez do terceiro. Habilidoso, conhecendo a paixão real pela caça, retratou o soberando portando um arco, a atirar numa raposa. O antebraço na arma tapava-lhe justamente o nariz. Diante do trabalho, o monarca sorriu satisfeito e recompensou o artista generosamente.

Alguém comentou:

- Há várias formas de se falar a verdade:

A primeira é a franqueza rude, contundente, que não hesita em expor toda a realidade dos fatos, doa a quem doer. Os partidários dessa atitude podem revelar o mérito da coragem e do desinteresse, mas tiram nota zero em relações humanas.

A segunda é a hipocrisia interesseira. Os deste grupo podem revelar inteligência e engenhosidade para distorcer os fatos, a fim de agradar aqueles a quem desejam conquistar.

A terceira é a dos partidários da verdade construtiva, evidenciando o que é útil, edificante, e elegante, omitindo sutilmente os aspectos menos agradáveis da vida do próximo.

Aqui vai um poema do Carlos Drummond de Andrade: Verdade.

13 fevereiro, 2006

Epígrafe

... a arte poética é a linguagem que expressa o inexprimível, o inenarrável, a "coisa" que está dentro da alma! Por isso, os poetas dizem que escrevem por necessidade, não por diletantismo. Os verdadeiros, claro.
Há momentos em que somos invadidos por emoções tão fortes, desconhecidas, ou tão estranhas, que palavras corriqueiras se tornam pálidas e vazias. Não foi em vão que muitos adolescentes (talvez nós mesmos, um dia) tomamos papel e lápis para, timidamente, rabiscarmos um poema apaixonado.
Titubeantes e gaguejantes, emendamos "amor" e "coração", rimamos "querida" com "amor de minha vida". Sim, por que não? Não é o estado da arte mas é a emergência de uma necessidade de dar sentido ao frêmito que descompassa o coração.
Cedo descobrimos: rimas pobres, palavras soltas ou garimpadas nos dicionários não nos tornam Poetas.
Então, recolhemos da estante um livro de Literatura para dele extrair alguma bela poesia que fale por nós. Muitas vezes, selecionamos uma música, pela melodia e pelos seus versos, seja um Renato Russo, Bob Dylan, Caetano...
Ah! como gostaríamos de ser poetas, "para eles é tão fácil", ingenuamente pensamos. Há, também, os poetas das telas, dos teclados, do mármore, da máquinas fotográficas, dos graffiti, etc.
Onde houver uma emoção indizível e um espírito criativo, aí pode germinar um poeta.
Tomar de empréstimo a Fernando Pessoa uma centelha de sua arte foi a alternativa que me restou para a epígrafe deste meu bloguinho.

08 fevereiro, 2006

Quarta maluca

Um dos supermercados do bairro promove, hoje, a "Quarta Maluca": às quartas-feiras oferece descontos significativos no setor de hortifrutigranjeiros.
É competição frontal com os "sacolões". Estes possuem bancas de legumes, frutas, raízes vendidos a 79 centavos o kilo, preço muitíssimo mais em conta que os praticados pelos supermercados. Nas quartas, a briga é até boa, supostamente em benefício do consumidor.

Trata-se, evidentemente, de estratégia de marketing para atrair mais gente à loja. A gente vai comprar uma "verdurinha" pro almoço e acaba comprando outros ítens. Há que ter objetividade e cuidado para não cair nas armadilhas dos marketeiros (que nos "vendem" até políticos corruptos!).

O título da promoção, "quarta maluca", pretende nos convencer de que os gerentes daquele estabelecimento "endoidaram", "amalucaram" e baixaram os preços: "Oba! estão doidos, estão vendendo bananas a preço de... banana!".

Maluco, porém, fiquei eu próprio, hoje, uma quarta-feira que já começou "da pá virada":

Os sintomas de loucura total começaram pela manhã, com a cozinha alagada. Feita uma anamnese cuidadosa, descobri que na véspera, antes de ir dormir, o Léo havia deixado o lava-louças cumprindo sua tarefa: xícaras, copos, pratos e talheres estavam limpos, mas a cozinha se transformara em lagoa!

O diagnóstico se firmou, um pouco mais tarde, quando o funcionário de uma empresa de manutenção veio tratar de outra loucura desencadeada na segunda-feira.
Dessa feita, os sintomas acometeram a máquina de lavar roupas, que não sabia mais se centrifugava, se torcia, se enxaguava.

Confusão de idéias e distúrbios de movimentos mereceram outra anamnese que, por sua vez, esclareceu o excesso de peso das roupas introduzidas naquele cilindro que chacoalha a roupa e deve ter chacoalhado a cabeça - o motor! - da dita cuja.

Dois disturbios matinais num dia de calor e um milhão de coisas para serem resolvidas só podem ser coisas de uma quarta-feira maluca:

O lava-louças sofrera ruptura vascular, ou seja, a mangueira tinha um furo. Não me perguntem a etiologia daquele buraco, pois nem mesmo o doutor-técnico soube explicar.
O exame anátomo-patológico da peça afetada revelou o que demonstra a ilustração abaixo:


Mais tarde, quando a Ana Letícia e eu fizemos, em cartório, a transferência do noso velho carro, vendido a preço de "quarta maluca", descobrimos que, ao preencher aquele documento próprio, ela o havia datado como se hoje fosse 08 de janeiro!

Conclusão: como estamos em 08 de fevereiro, o Detran-MG, que não brinca em serviço, já foi logo aplicando uma multa de R$ 127,00, já que a transferência do veículo estava fora do prazo (tem que ser feito em 30 dias corridos, e o documento indicava que 31 dias já se passaram!). De nada adiantou chorar e espernear, "dura lex sed lex", vale o que está escrito. Como diziam: "escreveu não leu, o pau comeu"!

O sol estava de rachar e a gente ali, enlouquecidos pela canícula de mais de 30 °C e pela loucura matinal dos eletrodomésticos.

Ou sempre fomos, nós mesmos, malucos?

04 fevereiro, 2006

"Nem só do pão vive o homem"

Conheci o Dr. Rodrigo da Cunha Pereira há alguns anos. Primeiro, pelos seus artigos e entrevistas na TV. Ele é Advogado, especialista em Direito da Família. Inaugurou, entre nós, uma abordagem sui generis das querelas familiares: uma compreensão para além do Direito, buscando entender as motivações inconscientes que tornam um inferno a convivência que prometia ser serena e amorosa entre os casais.

Rodrigo buscou conhecimento nos ensinamentos da Psicologia, em especial da Psicanálise, defendendo que a subjetividade de cada um deve ser levada em conta. A interpretação literal do texto jurídico é empobrecedora e pode levar a injustiças irreparáveis se desconhece a singularidade da cada caso e as motivações subjetivas que ensejam a conduta humana.

Certa vez, convidei-o para proferir uma palestra no lançamento de uma edição da Revista de Psiquiatria & Psicanálise com Crianças & Adolescentes, da qual sou editor.
O tema foi muito próprio: falou sobre a Paternidade.
Ultrapassou os ditames legais e enveredou pela especial relação entre pais e filhos. Defendeu uma tese original, apoiado em ensinamentos lacanianos a respeito do "pai simbólico": a verdadeira paternidade é adotiva!

Rodrigo enfatiza que o adjetivo se refere a um "movimento interior", "uma disposição do espírito", "uma decisão afetiva" que deve fundamentar a paternidade biológica tanto quanto a adotiva. É necessário que o pai (biológico ou não) "adote" realmente seu filho.

As crianças se sentirão abandonadas, órfãs mesmo, caso não recebam do pai o amor necessário ao seu desenvolvimento psico-social.
Esse tema foi brilhantemente retomado no artigo produzido pelo Dr. Rodrigo da Cunha Pereira publicado hoje no Caderno Pensar, do Estado de Minas.

Expõe suas idéias sob o título: "Nem só do pão vive o homem", explicando que "a compreensão social e jurídica da família contemporânea deve pressupor que a subjetividade interfere nessa organização, o que também afeta as decisões jurídicas".

O declínio da autoridade paterna, conseqüência do fim da ideologia patriarcal, apresenta hoje sintomas sociais sérios e alarmantes. Se os pais fossem mais presentes na vida de seus filhos, certamente não haveria tantas crianças e adolescentes com evidentes sinais de desestruturação familiar. Seria ingenuidade pensar que esses sintomas sociais que o cotidiano nos escancara são conseqüência apenas do descaso do Estado e de uma economia perversa. O que empurra um sujeito da favela para a marginalidade e o faz pôr fogo em um ônibus, é o mesmo “desejo desencaminhado” que faz adolescentes de classe média, ou rica, atearem fogo em um índio dormindo em um ponto de ônibus.

Rodrigo comenta uma decisão muito particular do STF (Supremo Tribunal Federal), ao dar ganho de causa a um filho que reclamou do pai uma indenização por danos morais sofridos. O filho em questão provou que fora abandonado afetivamente pelo seu pai, embora este tenha cumprido as exigências legais de pagamento de pensão alimentícia.

Escreve o Dr. Rodrigo:

O pai sempre pagou pensão alimentícia ao menor. Faltou alimento para a alma, afinal de contas, nem só de pão vive o homem. O pai, por seu lado, apresentou suas razões, dizendo que sua ausência se justificava por ter-se casado novamente e que moravam em cidades diferentes etc. Será que há alguma razão/justificativa para um pai deixar de dar assistência moral e afetiva a um filho? A ausência de prestação de assistência material seria até compreensível, se se tratasse de um pai totalmente desprovido de recursos. Mas deixar de dar amor e afeto a um filho... não há razão nenhuma capaz de explicar tal falta.

A defesa do pai alegara que "não se pode obrigar um pai a amar seu filho". Dr. Rodrigo argumenta:

Se um pai ou uma mãe não quiserem dar atenção, carinho e afeto àqueles que trouxeram ao mundo, ninguém pode obrigá-los, mas à sociedade cumpre o papel solidário de lhes dizer, de alguma forma, que isso não está certo e que tal atitude pode comprometer a formação e o caráter dessas pessoas abandonadas afetivamente. Afinal, eles são os responsáveis pelos filhos e isso constitui um dever dos pais e um direito dos filhos. O descumprimento dessas obrigações significa violação ao direito do filho.

É lógico que o dinheiro indenizatório não pagará, nunca, o prejuízo afetivo: o amor não tem preço, todos sabemos. Trata-se de uma intervenção ao nível do simbólico que ensina à sociedade que o abandono afetivo é violação de um dos direiros fundamentais dos filhos.

Muitos homens, ao se separarem, "encostam" os filhos nas mães, deixando a elas todo o cuidado afetivo, a educação, o apoio moral, a função de sustentar a Lei, etc. Contentam-se, esses pais abandônicos, a pagar a pensão alimentícia acordada judicialmente e deixam os filhos órfãos.

Um grande avanço esse entendimento "psicológico" da lei, não?

02 fevereiro, 2006

Se beber, não voe. Se voar, não beba.

Já li em algum lugar que os pilotos das companhias aéreas são muito propensos a usarem drogas (pesadas, inclusive), entre elas o álcool. As explicações são muitas: tédio durante as intermináveis travessias oceânicas; piloto automático que os dispensa de tarefas; salários bons que lhes proporcionam disponibilidade financeira; vida solitária (mesm para os casados), devido às constantes viagens e pernoites em cidades diferentes; hotéis confortáveis com bares convidativos; depressão; lazer que inclui idas a boates e restaurantes, onde é de praxe que se tome um drink, etc.

Aquele charme imaginado por nós, pobres mortais, é pura fantasia: no ar, a rotina é constante e os procedimentos de vôo são controlados por computadores e lista pormenorizadas de tarefas, altamente estressantes. Não é a toa que os sindicatos dos aeronautas recusa a colocação de câmeras de vídeo nas cabines - isso é o que já ouvi falar, alguém sabe melhor? Mesmo assim, viajo de avião sem problema nenhum, pois uso do mais manjado mecanismo de defesa que existe: negação!

Mas que passarinho fique bêbado, essa é novidade pra mim. Aqui em Minas (talvez alhures, também), se denomina a danada da cachaça de "água que passarim não bebe". Então, como é que as inocentes aves foram entrar nessa?

Eis a notícia:

Especialistas que examinaram 40 passarinhos encontrados mortos em Viena disseram que eles não foram vitimados pela gripe aviária, como se temia inicialmente, mas que se chocaram contra janelas, depois de se embebedarem ao comer frutas fermentadas. Os pássaros - cujos restos foram cuidadosamente examinados - tinham fígados tão ruins que "pareciam alcoólatras crônicos", disse Sonja Wehsely, porta-voz da autoridade de saúde animal de Viena. T

Todos morreram com o pescoço quebrado, depois de se chocarem contra vidraças, aparentemente depois de se esbaldarem em frutinhas que tinham começado a apodrecer. O processo de fermentação que acompanha a decomposição transforma o açúcar do suco da fruta em álcool.

Segundo a porta-voz, o processo de fermentação provavelmente continuava dentro do estômago dos pássaros, o que os deixava ainda mais desorientados durante o vôo.

Eu, hein?



Os "filhotes" Ângelo e Leo
e sua banda
Chapéu Panamá
HOJE
no
Consulado do Chopp
21h
Av. Francisco Sá (Prado)


"Quem não for é mulher do padre!"