21 abril, 2007

Daqui para uma melhor: uma viagem sem escalas

Sou do tempo em que crianças frequentavam aulas de Catecismo (at. catechismus,i 'instrução religiosa', do gr. katékhismós, do v. gr. katékhéó,ô 'fazer reter nos ouvidos, donde instruir de viva voz') Não, não era o do Carlos Zéfiro, era mesmo o Catecismo Romano, conjunto de normas e artigos de fé cristã/católica-romana, síntese das conclusões do Concílio de Trento (século XVI).

As aulas eram ministradas por uma velha senhora, muito rígida, que ensinava religião como quem lidava com hereges, pecadores contumazes e irremediavelmente condenados ao fogo eterno! Teríamos chance de escapar da condenação se praticássemos escrupulosamente os dez mandamentos, as quatro virtudes cardeais (prudência, justiça, fotaleza e temperança). Era mister obedecer aos cinco mandamentos da igreja (ouvir missa inteira aos domingos, confessar-se uma vez ao ano, comungar pelo menos uma vez anualmente, jejuar e fazer penitência, pagar os dízimos). Ah, e que não caíssemos nas tentações dos sete pecados capitais (ira, gula, inveja, orgulho, avareza, preguiça e luxúria)!

Ainda menino, vislumbrei um caminho difícil para ir direto ao céu. Tinha de ser uma viagem sem escalas, porque, mesmo evitando os pecados capitais, poderia morrer em pecado venial (etim lat.tar. veniális,e 'de perdão, leve, perdoável, desculpável'), o que me levaria ao purgatório (etim lat. purgatorìus,a,um 'que purga, purgativo, que purifica', já em Macróbio (fim do sIV d.C.) 'que purifica (a alma)'; como subst. ligado ao cristianismo (em gr. kathartêrion ou purgatóiron [tomado ao lat.]), o lat. purgatorìum se usa como 'lugar ou estado especial de pena e expiação de almas depois da morte'), menos terrível - posto que provisório!

Uma doutrina, porém, deixava-me intrigado: a existência do limbo (s.m. (1562-1575 cf. PaivSerm) 1 na religião cristã, morada das almas que, não tendo cometido pecado mortal, estão afastadas da presença de Deus, por não haverem sido remidas do pecado original pelo batismo (como, p.ex., as almas ditas justas que viveram antes do advento do cristianismo).

Se alguém morresse sem o batismo, mesmo que fosse virtuoso, não poderia ir para o céu, mas ficaria no "limbo" até o final dos tempos, quando se abririam as porteiras do céu. Seria necessário esperar muito, muito mesmo. Eu me regozijava por saber-me portador do passaporte, pois nascera em família católica. Entretanto, preocupavam-me os milhões de não-cristãos nascidos antes da instituição do batismo e em países onde não havia sido introduzida a fé cristã. Por que Deus faria uma coisa dessas?

Finalmente, vejo o noticiário:
Os teólogos do Vaticano estão convencidos, após vários meses de reflexão, que o limbo não existe e que as criancinhas mortas sem o sacramento do batismo vão diretamente para o paraíso.

Um documento da comissão teológica pontifical teve alguns extratos publicados no site da agência Catholic News Service (CNS) mas ainda não foi divulgado pelo Vaticano, apesar de pronto há várias semanas - precisou à AFP um integrante da comissão, o arcebispo de Dijon (França) Roland Minnerath.

Finalmente! Acabaram-se meus receios pelos bebês ficarem sofrendo no limbo até o fim dos tempos!
Agora, só me falta praticar os 10 mandamentos, as 4 virtudes cardeais e... ficar apenas nos pecadinhos veniais!

Quando vier o final dos tempos, quero ver cada um de vocês que me lêem. E nada de caírem de gozação em cima de mim - "-tão virtuoso, o Cláudio, coitado! - dizendo que pecaram, pecaram e se arrependeram na última hora e chegaram, igualmente, no bem-bom do paraíso!

Não! Não tenho pressa nenhuma de atravessar os portais da existência, muito menos desejo-lhes que partam em breve.
Por isso mesmo, conclamo a todos para se engajarem na campanha FAÇA SUA PARTE, assim como Lúcia Malla, Flávio Prada e muitos outros...