30 abril, 2008

26 abril, 2008

Daylight

Conexões - Foto by Cláudio Costa.

Fico a imaginar, da janela, se meus emails passam pelas antenas, bem ali.
Quase posso tocá-las.
Se, ontem, a torre se banhava de luar, hoje mergulha no anil.
As coisas são sempre as mesmas ou mudam conforme o olhar?
Existem realmente ou apenas reverberam ondas de luz, mais intensas ou tênues, de dia e à noite?
Que mensagens são captadas por ouvidos tão atentos e numerosos, que florescem no tronco metálico?
Antenas são ouvidos e olhos?
Será que espiam meus passos, escutam-me ao piano, censuram meus pensamentos?
A torre é feia e bonita.
A torre.
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Mais fotos: AQUI.

23 abril, 2008

Moonlight

Luar entre nuvens-Foto by Cláudio Costa


Da janela, a paisagem é dominada pela torre da Embratel, imponente em seu gradeado laranja. Mas a lua, mesmo entre nuvens, dominou meu olhar, com seu brilho intenso. E a torre ganha beleza ao submeter-se à dona do espetáculo: a Lua.

20 abril, 2008

Ecosofia

Não tenho certeza absoluta, mas quase posso jurar que a palavra 'ecologia' ressoou em meus ouvidos quando cursava Medicina, na UFMG, há 3 décadas! Se não me engano, explicava-se o aumento urbano de algumas doenças transmissíveis (febre amarela, doença de Chagas, etc ) se devia ao desequilíbrio ecológico provocado pela destruição das matas e expansão da fronteira agrícola e uso de agrotóxicos. Desde então, aumentou infinitamente a freqüência com a qual o termo passou a aparecer na mídia.


Fecho os olhos e rememoro minha aproximação ao conceito:


A princípio, entendia 'ecologia' apenas como ciência que estuda as relações dos seres vivos entre si ou com o meio orgânico ou inorgânico no qual vivem [na 1a. acepção do Houaiss]. Aprendi que a palavra se origina da justaposição de dois termos grego: óicos [casa] + lógos [estudo, palavra].


Aos poucos, o conhecimento de que a sobrevivência da humanidade está em risco no Planeta Terra (nossa casa) está cada vez mais bem determinado. Ecologia se torna uma questão de vida ou morte e estudos demonstram que o aumento desmesurado da insdustrialização, o uso de combustíveis fósseis, a superpopulação, as alterações climáticas devidas ao acúmulo de gases na atmosfera e muitas outras atividades esgotarão as reservas de oxigênio, de água e de terras aproveitáveis. Morreremos de fome, de sede, de calor, de asfixia, de inanição... O Planeta sobreviverá, claro, mas ninguém estará aqui para ver a Natureza se recuperar por si, alguns milhões de anos depois do último Homem.
A Natureza sobreviverá ao Homem e àquilo que o distingue das coisas e dos animais, ou seja, à Cultura? E o título auto-aplicado de "rei da natureza" que acreditávamos ser verdadeiro e absoluto? Um paradoxo se constitui: de um lado, a Ciência que cria modos de domínio e manipulação dos recursos e forças naturais; por outro, a constatação de que será mortífera a utilização descontrolada, desmedida e intensa daqueles mesmos recursos. Há que mudar.


Mas será que conseguiremos mudar nossa relação com o meio ambiente sem mudar a nós mesmos?


"Existe uma ecologia das idéias danosas, assim como existe uma ecologia das ervas daninhas." [BATESON, Gregory. 2000 [1972]. Steps to an Ecology of Mind. Chicago: The University of Chicago Press.]


Com esta citação, Félix Guattari inicia importantes reflexões em seu livro As Três Ecologias (Campinas-SP, Papirus Editora) - Resumo.
Apesar de estarem começando a tomar uma consciência parcial dos perigos mais evidentes que ameaçam o meio-ambiente natural de nossas sociedades, elas [as formações políticas e instâncias executivas] geralmente se contentam em abordar o campo dos danos industriais e, ainda assim, unicamente numa perspectiva tecnocrática, ao passo que só uma articulação ético-política – a que chamo ecosofia – entre os três registros ecológicos (o do meio-ambiente, o das relações sociais, e o da subjetividade humana) é que poderia esclarecer convenientemente tais questões.


O conceito de Ecologia se estende à Ecosofia, que se orienta para três registros:


a) o registro do meio ambiente: a ecologia mais conhecida e difundida pela mídia, visando a preservação do ecossistema, das fontes de energia, das reservas de água potável, sobrevivência das espécies, etc.


b) o registro das relações sociais: "não haverá resposta à crise ecológica a não ser em escala planetária e com a condição de que se opere uma autêntica revolução política, social e cultural, reorientando os ojetivos da produção de bens materiais e imateriais." (p.09) Uma ecosofia social tratará de modificar e reinventar maneiras de ser no seio do casal, da família, do constexto urbano, do trabalho, etc. Não é fácil...


c) e a ecosofia da mente? Pois é, essa vai fundo, pois questiona a própria noção de subjetividade. É claro que as teorias psicanalíticas e estruturalistas serviram de fonte para o questionamento da subjetividade cartesiana ("penso, logo existo"). Na verdade, há outras maneiras de existir fora da consciência. Por isso Guattari prefere falar em componentes de subjetivação. Questiona, pois, o individualismo, o consumismo, a alienação e a passividade nossa de cada dia.


Salvar-nos, neste mundo, é tão ou mais difícil que salvar o Planeta!

12 abril, 2008

Mirante

...sempre pensei por que alguém, a prefeitura, a bhtur ou qualquer um não faz um mega-mirante na serra do curral?

Serra do curral é a fortaleza de beagá [ouvi dizer há muito tempo: se acaso houvesse uma guerra nuclear nossa cidade seria protegida exatamente pela serra que deu o nome ao antigo arraial del rey, mais tarde belo horizonte capital das gerais].

Igualmente diziam que era tombada pelo patrimônio histórico ou pelo ibama ou por alguma outra entidade protecionista e que haveria o risco de a montanha acabar - o que não impediu às mineradoras tipo a famigerada mbr-mineradoras brasileiras reunidas que de brasileira mesmo só tinha a montanha já que o minério ia embora daqui a preço menor do que o de banana que por sinal está pela hora da morte [pelo menos é assim que diziam antigamente]... pois é não impediu às tais mineradoras que comessem quase tudo das entranhas do lado escondido daquele morro / a cidade do lado de cá foi subindo com favelas e com mansões tal como demonstra o aglomerado da serra e o taquaril e o alto vera cruz tudo favela sem falar do luxo do mangabeiras e do belvedere e da avenida seis pistas onde fica o biocor e mil outros empreendimentos imobiliários. Ufa!

...sempre foi uma alegria poder ver a serra lá do alto vindo de avião do rio de janeiro ele voando mais baixo preparando-se para descer na pampulha e eu de olho agarrado ali na janelinha a gente só vendo as serras da moeda e do rola moça à esquerda a br40 embaixo beirando a lagoa dos ingleses e lá longe à esquerda horrorizar-me com as crateras da mineração [solo lunar ou marciano tanto faz] muito feio e doído no coração da gente.

...de repente quase que num susto surge a cidade inteirinha por detrás do paredão da serra: um montão de prédio e casa e rua e a cidade toda espraiada sobre colinas com os carrinhos e ônibus de brinquedo correndo pelas ruazinhas tudo miniatura mas poluída mesmo assim bonita por natureza que beleza.

...e eu ali na janelinha do avião que se prepara para pousar em instantes no aeroporto da pampulha favor apertar os cintos e colocar o encosto das poltronas na vertical eu juntando jornais e revistas de bordo fecho a bandeja do lanche recém recolhido e guardo nas retinas nem tão fatigadas as imagens da cidade - pedacinhos que via e rotulava aqui é a praça do papa olha a avenida afonso pena ali e o mineirão já tão perto, nossa! a lagoa! a lagoa com a igrejinha de são francisco de niemeyer e o pic e o iate e o museu e a barragem.
Chegou!

Num tranco o trem de pouso bate na pista o bichão taxiando e meus olhos perscrutando (!) a varanda do aeroporto será quem veio me buscar? Amélia e os meninos ali.
Cheguei!

Foto by Celso Santa Rosa/Jornal Estado de Minas
"Um dos mais bonitos e famosos cartões-postais de Belo Horizonte, a Serra do Curral começa a ser transformada em parque municipal. Depois de quase uma década de expectativa, desde a publicação do Decreto 13.190/99, determinando a criação do Parque Paredão da Serra, a prefeitura da capital deu início, esta semana, às obras. Ao todo, será investido R$ 1,3 milhão (recursos do Ministério do Turismo, com contrapartida do município) para a construção de jardins, trilhas, praças, portarias, mirantes, guaritas de vigilância e sistema de segurança ambiental, numa área de 397,8 mil metros quadrados, projetada para ser o novo ponto turístico da cidade." [Glória Tupinambás, Estado de Minas - 11.abr.2008]

06 abril, 2008

LOUCURA: Festival e Museu

"Quando eu era criança pequena lá em Barbacena..." tornou-se bordão em antigo programa humorístico. Muitos já começavam a rir à sua simples enunciação, provavelmente pelo forte sotaque capira, pela vestimenta inadequada e, principalmente, pela expressão abobalhada e louca do ator.

Associar Barbacena à loucura não é sem propósito, uma vez que lá se criou o primeiro hospício para loucos em Minas Gerais. Segundo Moacyr Scliar
"no começo do século passado, a cidade pleiteava se tornar a capital de Minas Gerais. Perdeu para Belo Horizonte, mas, como costuma ocorrer em nosso país, os políticos trataram de providenciar algum tipo de compensação para os barbacenenses ... Era a fase do alienismo: a psiquiatria não tinha muito a fazer pelos pacientes e, por causa disso, os internava em instituições gigantescas. Barbacena ganhou, então, o seu hospício" (Jornal Zero Hora, 19;mar/2007, p. 2).

Hospício de Barbacena, 1912. Foto-reprodução by Cláudio Costa (5.abril.2008)

Muita água passou por debaixo da ponte, desde então. Muita gente, também, passou pelos portões do grande manicômio, crescido desmesuradamente, até tornar-se um verdadeiro campo de concentração, com milhares de internados, numa rotina dantesca de dessubjetivação, humilhação, doença e morte. O Centro Hospitalar Psiquiátrico de Barbacena(CHPB) se tornou o macabro fornecedor de corpos para os estudos de anatomia, afora os quase 60.000 enterrados em seu Cemitério do Cascalho.

A coisa se institucionalizou de tal forma que até a Estrada de Ferro Central do Brasil estendeu um ramal às suas imediações e autorizou a parada dos comboios, bem ali. Havia um desvio na estação, onde o guarda-freios desconectava o último vagão, repleto de loucos embarcados desde o longínquo norte mineiro: era o trem de doido, expressão elogiosa que define, hoje, algo muito bom.
1979: As possibilidades de transformação e extinção daquele inferno principiam em 1979, a partir do Movimento Nacional de Trabalhadores de Saúde Mental. Em julho, acontece em Belo Horizonte o Seminário de Psiquiatria Social, com a presença de Franco Basaglia, psiquiatra italiano, que visitou os hospitais psiquiátricos mantidos pelo Estado (Instituto Raul Soares e Hospital Galba Velloso, na capital; CHPB, em Barbacena). O jornalista Hiram Firmino escreve uma série de reportagens, intitulada "Os porões da loucura" . O cineasta Helvécio Ratton produz o documentário "Em nome da razão", retratando o interior dos porões, as precariedade da assistência, o descaso para com seres humanos desprovidos de qualquer dignidade. A sociedade se mobiliza. Os portões começam a ser abertos. Psiquiatras e outros profissionais se reúnem no II Congresso Mineiro de Psiquiatria. Bem devagar, mas inexoravelmente, as coisas começam a mudar.

2006: Em março de 2006, realiza-se o Primeiro Festival da Loucura de Barbacena, evento organizado pela Prefeitura. A princípio, só festa, como que para exorcizar os fantasmas e o estigma que traumatizava a própria menção do nome da cidade. Tom Zé, Hermeto Pascoal e Lobão fazem os shows. Há encenação de peças teatrais, exposição de artes e filmes.
Agora, em 2008, estive lá para o Festival da Loucura número 3: o evento cresceu e teve uma parte científica, com três mesas redondas: Nunca houve um homem como Heleno (aquele jogador do Botafogo, que faleceu no hospício); O Alienista (pelo centenário de Machado de Assis); Debate sobre o documentário Omissão de Socorro (de Olívio Tavares de Araújo), Van Gogh, o artista e o sujeito (sobre o homem que habitava o artista).
Neste final de semana pude ver a exposição de fotos, uma peça de teatro e visitei o Museu da Loucura.

Pois é, há 10 anos se criou, no "torreão" do antigo hospício, um museu com fotos, objetos e depoimentos sobre os porões da loucura. Métodos primitivos e desumanos para tratar os alienados não podem ser esquecidos para que nos lembremos de quão frágil era o pretenso cientificismo do início do século passado. Um alerta para nós, psiquiatras de hoje, que devemos avaliar cuidadosamente as promessas das neurociências: será que as certezas de hoje serão, um dia, objeto de museu?
Torreão do Museu da Loucura. Foto by Cláudio Costa (5.abril.2008)