31 dezembro, 2008

Museu de Artes e Ofícios


Museu de Artes e Ofícios, upload feito originalmente por ClaudioCosta.

O domingo estava chuvoso e a preguiça submergia qualquer atividade. Mas mexer-se é preciso.
Eis que surge a idéia: visitar o Museu de Artes e Ofícios, tão elogiado por todos que o conheceram. Fica logo ali, bem no centro da cidade, na antiga estação da EFCB (Estrada de Ferro Central do Brasil). Com a decadência do transporte ferroviário de passageiros - uma aberração deste país - a estação estava quase totalmente ociosa, embora por ela transitasse, ainda, o Metrô de superfície de Belo Horizonte.


Pois agora lá está o MAO e fomos conhecê-lo.


Seriam necessárias várias visitas para usufruir de tanta informação, tantos objetos e fotos, uma viagem ao passado e um resgate dos ofícios e seus instrumentos.
Há história, há arte, há antropologia... tudo ali, bem disposto, com textos explicativos e estética impecável. É um dos mais completos e bem estruturados do Brasil (leia mais).
No próximo domingo chuvoso, quem sabe, driblemos a preguiça!

27 dezembro, 2008

Triz


Árvore de Natal na Pampulha, upload feito originalmente por ClaudioCosta.

Onde estão aqueles olhos cansados
que agora brilham, alertas?

Uma criança esquecida
dentro do corpo do adulto
sacode o corpo maduro
descrente de tudo que vê

Onde está o feitiço
que, olho no olho, prendia
o olhar de Pedro e Maria?

Eis que baila no espaço
ou sobre as águas - não sei -
um cone de luz que reluz.

É festa, é fogo, ilusão,
é busca, esperança, utopia talvez.

Foi quase por distração,
mas não dá pra mentir:
Por um triz,
fui feliz!

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Clique aqui pra ver os efeitos especiais.

23 dezembro, 2008

Jandira ou O Padre e a Moça

Aos 13 anos, Jandira saiu de Ponte Nova e veio morar com parentes em Belo Horizonte. Passou a residir na praça da igreja matriz de um bairro próximo ao centro, lugar ainda aprazível nos meados da década de 60.

Rapidamente envolveu-se nos chamados grupos de jovens da paróquia. Menina esperta e graciosa, entrosou-se com todos. Ao lado da igreja, os padres mantinham pequena gráfica onde imprimiam, além de folhetos litúrgicos, livros e revistas de sadia literatura, vidas de santos, calendários e impressos em geral.

Jandira, a pedido da tia, foi contratada pelo Padre Antero, conhecedor da disposição da menina. Ela estudava pela manhã, ali mesmo no bairro e, tão logo almoçava, já estava separando papéis, paginando e grampeando fascículos. Miudinha, esticava-se na ponta dos pés diante daquelas mesas que lhe pareciam altas, enquanto tagarelava com os outros funcionários.

Sábado à tarde acontecia o "grupo de jovens", no qual se combinavam passeios, atividades pastorais, barraquinhas, etc. Até viagem à praia fizeram! Uma aventura somente permitida porque o senhor padre acompanharia os rapazes e as moças. Foi quando Jandira conheceu o mar. Lembrança para nunca se perder.

A menina se transformou em moça, vigiada pela tia zelosa. Dentro do espírito de
aggiornamento do Concílio Vaticano II, o próprio vigário patrocinava, ocasionalmente, uma Hora Dançante no pátio interno da casa paroquial. O som era garantido pelas primeiras bandas-de-garagem surgidas em Belo Horizonte. Guitarras estridentes embalaram muitos namoros e flertes com as baladas dos Beatles e do romântico The Mamas and Papas...

A moça Jandira era comunicativa e adorava conversar com o padre Antero, a quem chamava de Tio. Eram conversas alegres, despretenciosas, sem maldade. Certa vez, organizou-lhe uma despedida, designado que fora para um curso especial de Teologia, em Roma. Nem bem o padre viajara e o carteiro passou a entregar, semanalmente, cartões postais vindos da Europa, exibidos orgulhosamente para toda a família e para os amigos. Um privilégio só dela, pois a mais ninguém o padre escrevia.

No dia de seus 20 anos, chega um pacote cheio de selos e carimbos, direto de Roma, par avion.
-Gente, exclamou, o tio lembrou-se de meu aniversário!
Rodeada de amigos e parentes, desembrulhou cuidadosamente a encomenda. Um cartão trazia as mais lindas palavras de Feliz Aniversário, lidas e relidas para todos, atentíssimos. Havia, ainda, duas pequenas caixas. Na primeira, um xale de seda, multicolorido - "a coisa mais linda que já vi". O que haveria no outro?
-Olha, gente, é uma camisola!
Ouviu-se um longo "Ohhhh!". Ali, em suas mãos alvas e trêmulas, cintilava minúscula lingerie vermelha, de seda pura, finíssima, de ótimo gosto, coisa nunca vista!
-Ohhhh!, o padre Antero lhe enviou isto?, exclamou a tia.
Jandira, inocente, não percebeu qualquer insinuação por parte dos outros, simplesmente se emocionava com o carinho que lhe devotava o Tio Antero. Nem lhe passou pela cabeça qualquer sentido além da pura amizade e dedicação de um pastor por uma humilde ovelha...

O sacerdote chegou algumas semanas depois e logo Jandira foi dar as boas vindas e agradecer tantos cartões e presentes. Padre Antero abraçou-a efusivamente. Ao ficarem a sós, disse-lhe:
-Jandira, vim para casar-me com você!
A moça deixou escapar um riso solto, quase uma gargalhada:
-Que isso, tio? O senhor é padre!. (Não conseguia parar de rir).
-Eu vou me casar com você, estou dizendo, nós vamos nos casar!

Foi aí que a moça se deu conta de que ele falava sério. Tomou o maior susto de sua vida, pois nunca imaginara que aquele homem 35 anos mais velho, ainda mais um padre, se interessasse por ela. Nem ela mesma jamais sentira qualquer atração pelo vigário.

Atordoada, atravessou a pracinha já decidida a voltar imediatamente para Ponte Nova. Largou tudo: escola, emprego, amigos. Pai e mãe, católicos tradicionais, a receberam com uma chuva de recriminações. Pouco a pouco
, como a calmaria sucede as tempestades, o assunto se extinguiu, instaurou-se a rotina e namorados se sucederam na vida daquela mocinha.

Um ano se passou.
Era o mês de maio. O céu do domingo estalava de azul, enquanto o sol aquecia o vale do Rio Piranga. Jandira estendia roupas no varal do terraço quando percebeu um movimento incomum de automóveis. Contou cinco carros dos quais desciam pessoas que nunca vira. No meio delas, reconheceu o padre Antero, sem batina! Coração aos pulos, desce correndo e já encontra a comitiva sendo recebida pelo seu pai. A mãe, lá dos fundos, vem enxugando as mãos no avental. Ninguém entendia nada de nada. Todos falavam alto. No meio daquele alvoroço, o irmão do padre diz:
-Viemos para o noivado!
Padre Antero se adianta e
, solenemente, declara ao pai da Jandira:
-Estou aqui para pedir a mão de sua filha em casamento. Consegui que o Papa me dispensasse dos sagrados votos do sacerdócio e meu Bispo já me liberou. Os papéis estão aqui.
Apresentou um documento da Cúria Romana, timbrado com a Mitra Papal, onde se liam palavras em Latim. Em seguida, abre uma caixa minúscula, forrada de veludo vermelho:
-Para demonstrar a seriedade de minha proposta, eis as alianças. Vieram meus irmãos, minhas irmãs e alguns paroquianos como testemunhas.
O pai gaguejou qualquer coisa, esticando os beiços para os lados de Jandira:
-Isso é ela quem resolve.
Diante de todos, o agora ex-padre se aproxima da moça:
-Não falei que iria casar-me com você?

Apesar das advertências dos parentes, pais e amigos que vaticinavam futuras desavenças, desentrosamento entre cônjuges com tamanha diferença de idade e discriminação social, celebra-se o casório vinte dias depois, numa capela de Belo Horizonte. O fato era tão extraordinário que uma emissora de rádio perseguiu o carro da noiva, na tentativa de cobrir a cerimônia, ao vivo.

Casaram-se e tiveram três filhos.

. . .

Outro dia, aos 89 anos, faleceu o ex-padre Antero.
-Ele sempre me amou muito. Aprendi a gostar dele depois do casamento, pois nem namorar a gente namorou, diz-me Dona Jandira. Agora estou só, como é triste a solidão... Nós nos amávamos tanto!
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Essa história é verídica. Republiquei-a com os comentários anteriores, pois há novidades no ar. Depois eu conto.

22 dezembro, 2008

Blogs'n soup

O tempo úmido pedia encontros calorosos e alimentos quentes regados a cervas geladas. Foi exatamente o que providenciou o grande Idelber, acrescentando biscoito fino & massa a um encontro agradabilíssimo: intimou-nos a comparecer ao tradicional Skaldos [46 tipos de caldo de fabricação própria, desde o de carne com cebola, pimentão, cebolinha, salsa, azeitona, creme de leite, palmito e milho verde ao caldo de camarão com catupiry, cebolinha, salsa e tomate] na Praça Duque de Caxias, em Santa Tereza (pertinho da famosa esquina onde nasceu o mineiríssimo Clube da Esquina).

Nem precisa dizer que havia blogueiros e comentaristas de blog, categoria de leitores atentos que enriquecem os debates provocados por textos inteligentes da blogosfera.

Lá fomos nós, Amélia, Ana Letícia&Thiago e moi-même. Ao garçon coube a façanha de rearranjar as mesas, de tal forma que todos nos acomodássemos em torno de bate-papo agradabilíssimo, animado, multi-temático, levemente alcoólico [olha a lei seca aí, gente!], futebolístico, político, psicanalítico, jornalístico, jurídico e literário [lá estava Ana Maria Gonçalves, autora de um dos mais densos, interessantes e irresistíveis romances da língua portuguesa: Um defeito de cor].
Tudo de bom foi este encontro:
Altos papos

17 dezembro, 2008

Presépio mineiro

A tradição católica diz que o presépio surgiu no século 13, quando São Francisco de Assis quis celebrar um Natal o mais realista possível e, com a permissão do papa, montou um presépio de palha, com uma imagem do Menino Jesus, um boi e um jumento vivos perto dela. Nesse cenário foi celebradada em 1223 a missa de Natal. O sucesso dessa representação do presépio foi tanta que rapidamente se estendeu por toda a Itália. Logo se introduziu nas casas nobres européias e de lá foi descendo até as classes mais pobres. [daqui]

Desde a infância acompanhei a construção de presépios na minha casa. Início de dezembro era época de a meninada correr aos quintais em busca de pedras bonitas e musgos, que serviriam de caminhos e jardins no bucólico cenário de casinhas, pastagens e a gruta onde nasceria o Menino.

Aos adultos (lá em casa era minha mãe, mesmo) competia preparar as montanhas. Como? Cobriam-se com areia de minério azul escuro e faiscante os sacos de aniagem ou o grosso papel de cimento, previamente preparados com grude feito de polvilho e água.

Aos poucos, uma cidadezinha ia surgindo, fabricada com casinhas de madeira, cerâmica e papel maché, retiradas cuidadosamente das caixas que as guardavam do ano anterior.

Era um momento mágico: minha mãe e a criançada ao lado a desmbrulhar cuidadosamente os personagens e adereços guardados do ano anterior. Alegria maior era quando surgiam os bichos: ovelhas, burro, vaca, leões, girafa, patinhos, galinhas, um zoo inteiro! Não podia faltar um garboso galo carijó, que seria colocado em destaque. Ao galo caberia cantar bem alto, anunciando o nascimento de Jesus.

Seria apenas uma lembrança do passado, não fosse a determinação da Amélia de manter a tradição aqui. Nem que fosse simples improvisação, um aranjo com manjedeoura, o Menino, José e Maria.

Aos poucos, Amélia se sofisticou e, ultimamente, o presépio foi tomando importância e ganhando detalhes. Posso dizer que se amineirou, pois se caracteriza como uma vila do interior, construída com casinhas de cerâmica moldadas pela Jovita no Vale do Jequitinhonha e outras advindas de várias regiões do Brasil.

Se, ano passado, o presépio se restringiu a uma cidade plana com suas ruazinhas tortas ladeadas de casinhas, agora em 2008, novamente ajudada pelo filho Ângelo e pela norinha Renata, as montanhas de Minas compõem o cenário:

16 dezembro, 2008

Me engana que eu gosto

Reza a lenda que nós, mineiros, vendíamos bondes elétricos aos cariocas e paulistas interioranos. O gajo adquiria o trambolho que chocoalhava na novel capital das Alterosas, mas jamais o levava pra casa.
E os mineiros ricos e bobos que compraram dos cariocas o morro do Pão de Açucar? Não comeram nem mesmo os brioches da Confeitaria Colombo.
Há terráqueos que adquiriram terrenos na Lua, desde que um sujeito esperto a registrou como propriedade particular.
No aeroporto de Brasília vi, com estes olhos que um dia a terra há de comer, ampolas contendo "ar de Brasília" vendidas em lojas de lembranças. Na época, custavam R$ 5,00 a unidade. Pois havia turistas que compravam várias!
Alguns inconformados com a aproximação da morte desembolsaram milhares de dólares para que fossem congelados pelo tempo necessário à descoberta da cura de suas doenças: esperam acordar fresquinhos, lampeiros e saltitantes, após reaquecidos da hipotermia. Pelo menos não ficarão ardendo no fogo do inferno, já que repousam no freezer.
Ao me olhar no espelho, vejo um sujeito com cara de bobo que mantém o despertador 20 minutos adiantado pra não perdar a hora!!!

Eduardo Giannetti escreveu sobre este tal de auto-engano: auto-engano é muito bom e talvez indispensável para nos sustentar neste vale de lágrimas, expulsos que fomos do Éden, após sucumbirmos às vãs promessas de uma serpente esperta. Falácias nos arrebatam, promessas elegem candidatos e fantasmas nos assombram.
Viver de ilusões e praticar a máxima "me engana que eu gosto" é tão velho quanto o salto evolutivo de macaco a homo sapiens (sapiens?). Há dois posts anteriores, quase acreditei na matéria do Estado de Minas, eu lá estampado na capa, casal vinte posando de celebridade (hehehe).
Toda essa falação aí é para recomendar este post do Milton Ribeiro: um time gaúcho comprou o nome de uma estrela da Constelação de Orion!

14 dezembro, 2008

111

Cento e onze anos completou Belô, dia 12/dez.

Igreja S. Francisco - Pampulha - BH

É uma jovem cidade, com belezas e mazelas, tão nova e tão cheia de problemas: trânsito, falta de transporte público digno, diferenças sociais gritantes. Mas é época de festa e a cidade tem lá seu lado bom, bonito, arrumado, moderno e "mineiríssimo".


Edifício projetado por Oscar Niemeyer - Praça da Liberdade - Belo Horizonte-MG


Acolheu-me há décadas. Aqui me formei, casei, tive filhos. Aqui me sustento. Não diria que já sou belorizontino, pois Nova Era ainda está em mim: menino do interior, carrego lembranças e emoções, saudades do meu pai e minha mãe que lá estão, dos irmãos, parentes.
Mais fotos AQUI.

Video sobre processo de produção e suas mazelas

Recebi o link deste vídeo. Achei interessante, apesar dos 21min de duração.