03 fevereiro, 2005

Carnaval radical

Todo mundo já sabe, mas gosto de me lembrar: "Carnaval" se refere a uma festa anterior à Quaresma, período em que os cristãos deveriam abster-se de comer carne, preparando-se para a semana da Paixão. A origem do termo é a contração de duas palavras latinas: carne + leváre = 'abstenção de carne'. O primeiro elemento do vocábulo "càro,cárnis" = carne; e o segundo, o verbo "leváre" = tirar, sustar, afastar.
Já que ninguém é de ferro, prevendo mais de um mês sem ingestão de carne, o que fazer? Vamos comer tudo a que temos direito, agora, já!
Além da carne de boi e de vaca, outras passaram a fazer parte da festa. O que tem de bunda, seio, perna, coxa se oferecendo à gula dos olhares...Há muito mais à disposição para serem comidas, mas esse espaço, aqui, tenta manter uma certa classe! No meio de tanta mercadoria, sereias e baleias. Até cobras (epa!), em certos bailes, andam à solta, pois não há quem goste?
Se muitos botam, outros despem as fantasias mantidas durante o ano todo (bom moço, boa moça, funcionário certinho, marido fiel, esposa dedicada), jogam tudo pro alto, ligam o botão foda-se e se apresentam tal qual são, ou como gostariam de ser. E tudo volta ao normal na quarta-feira.
Bem, na quarta-feira de cinzas é tempo de se lembrar de que ao pó retornaremos: Memento homo quia pulvis es et in pulverem reverteris.... Até as estátuas, um dia, voltarão ao pó!
Assunto chato, esse!
Se você leu até aqui, nem precisa ler o que o Frei Betto escreveu em sua crônica semanal no EM. É um carnaval bem radical, o que ele propõe, não acha? Olhacá:
"Quero o baile, a fantasia, a loucura insaciada dos que fazem desfilar em blocos seus desejos irrefreáveis. Arranco do coração uma por uma das máscaras de minha coleção: a do cínico, do farsante, do pusilânime. Quero-me nu, completamente nu, na passarela em que me exibirei pelo avesso: aversões e preconceitos, contradições e mesquinharias. Sairei de barro e sopro, tal qual Deus me pôs no mundo."