Balada do Louco: "Este é um blog aberto e coletivo, em que as pessoas dividem suas experiências e lembranças de loucos. Resgatar essas histórias, imortalizar a loucura que não sai de nossas lembranças, é um tributo que devemos não apenas à loucura deles, mas à nossa normalidade. Se é que somos normais. Participe enviando a sua história para baladadolouco arroba gmail ponto com".
Não resisti à provocação. Envei um relato verídico, com algumas modificações exigidas pela Ética Médica, garantindo o sigilo profissional. Já saiu lá publicado. Os relatos são curiosos. Conquanto despretenciosos, são verdadeiros estudos psico-sócio-antropológicos oferecidos pela observação cotidiana. Mais que curiosos são instigantes. O ser humano é tão cheio de possibilidades e a singularidade de cada um é tão absoluta que, afinal, onde estará a fronteira entre o normal e o patológico? Já dizia o Caetano, com propriedade: De perto, ninguém é normal! Anime-se a colaborar.
Aqui está minha contribuição, que espero seja a primeira de uma série.
João Antônio tinha trinta e três anos e uma certeza: era o Cristo que retornara para julgar os vivos e os mortos.
- É... o Cristo do Apocalipse, conhece, doutor?
E desfiou as razões que fundamentavam sua certeza, tal um matemático demonstra um teorema ou um filósofo deduz com silogismos perfeitos.
Primeiramente, a idade.
- Trinta e três anos tinha o Cristo quando foi crucificado e eu aqui estou continuando sua trajetória terrena.
- Além disso, o número do medidor da companhia de eletricidade em minha casa termina com uma sequência de seis, a da Besta do Apocalipse: 666. Descobri quando fui fazer uma reclamação na CEMIG e tive de anotá-lo. Foi uma mensagem, um sinal. Um Sinal, com S maiúsculo, sabe, doutor? A gente precisa ler os sinais, decifrar os códigos que estão à nossa volta, como fez Nostradamus.
- E mais: nasci no Brasil, cujo nome primeiro foi Terra da Santa Cruz. A cruz é a síntese: cruzamento do horizontal com o vertical, tempo e espaço. Pois o meu sobrenome, o senhor já anotou aí, é da Cruz. João Antônio da Cruz. Outro dia, uma kombi parou de repente num cruzamento. Bati na traseira e já saí gritando seu estúpido, por que parou sem avisar? O motorista saiu sorrindo, na maior calma. Vestia uma camiseta de crente, na qual estava escrito Jesus te ama. E a placa daquela kombi era: JAC-1972. Era a o ano de meu nascimento e minhas iniciais, doutor! Só não vê quem não quer.
- Agora, o senhor me diga, o senhor acredita que eu sou o Cristo? Não quero palavra de psiquiatra, porque a ciência é uma coisa, religião é outra. Fale como pessoa humana, doutor.
Não resisti à provocação. Envei um relato verídico, com algumas modificações exigidas pela Ética Médica, garantindo o sigilo profissional. Já saiu lá publicado. Os relatos são curiosos. Conquanto despretenciosos, são verdadeiros estudos psico-sócio-antropológicos oferecidos pela observação cotidiana. Mais que curiosos são instigantes. O ser humano é tão cheio de possibilidades e a singularidade de cada um é tão absoluta que, afinal, onde estará a fronteira entre o normal e o patológico? Já dizia o Caetano, com propriedade: De perto, ninguém é normal! Anime-se a colaborar.
Aqui está minha contribuição, que espero seja a primeira de uma série.
Apocalipse Now
João Antônio tinha trinta e três anos e uma certeza: era o Cristo que retornara para julgar os vivos e os mortos.
- É... o Cristo do Apocalipse, conhece, doutor?
E desfiou as razões que fundamentavam sua certeza, tal um matemático demonstra um teorema ou um filósofo deduz com silogismos perfeitos.
Primeiramente, a idade.
- Trinta e três anos tinha o Cristo quando foi crucificado e eu aqui estou continuando sua trajetória terrena.
- Além disso, o número do medidor da companhia de eletricidade em minha casa termina com uma sequência de seis, a da Besta do Apocalipse: 666. Descobri quando fui fazer uma reclamação na CEMIG e tive de anotá-lo. Foi uma mensagem, um sinal. Um Sinal, com S maiúsculo, sabe, doutor? A gente precisa ler os sinais, decifrar os códigos que estão à nossa volta, como fez Nostradamus.
- E mais: nasci no Brasil, cujo nome primeiro foi Terra da Santa Cruz. A cruz é a síntese: cruzamento do horizontal com o vertical, tempo e espaço. Pois o meu sobrenome, o senhor já anotou aí, é da Cruz. João Antônio da Cruz. Outro dia, uma kombi parou de repente num cruzamento. Bati na traseira e já saí gritando seu estúpido, por que parou sem avisar? O motorista saiu sorrindo, na maior calma. Vestia uma camiseta de crente, na qual estava escrito Jesus te ama. E a placa daquela kombi era: JAC-1972. Era a o ano de meu nascimento e minhas iniciais, doutor! Só não vê quem não quer.
- Você é quem diz, João Antônio.
Outras provas foram descritas, fundamentadas em fatos vivenciados e interpretações que eu chamaria de delirantes.
João insitiu mais uma vez:
- Vou perguntar de novo, ou o senhor responde ou Deus mesmo enviará um sinal. O senhor acredita?
Neste exato momento, uma pomba, das muitas que infestam os arredores, pousa sobre o peitoril da janela.
- Tá vendo? Nem precisa responder. Eis o sinal. Quando chegar a hora, o senhor saberá.
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