João Paulo Cunha é o Editor de Cultura do Caderno Pensar, do Estado de Minas. Hoje, entre outras reflexões, publicou:
"O teatro de horrores que tomou conta da sociedade brasileira nas últimas semanas tem como pano de fundo a questão da verdade e da mentira. Mais do que isso: da necessidade de se dizer a verdade e evitar a mentira quando se trata de interesse coletivo. De tal maneira se borraram as distinções entre público e privado, que o valor da verdade ficou solto, pendendo ora para os interesses pessoais (até os mais inconfessáveis são hoje confessados com certo orgulho), ora para a reafirmação de uma arena responsável de interesses sociais. Nesse palco, os meios de comunicação, muitas vezes, prestam um desserviço, ao valorizarem mais o que desvia do que aquilo que corrige.
A polêmica não é nova. Kant e Benjamin Constant travaram um debate sobre o direito de mentir por razões humanitárias, em pleno furacão do iluminismo. Do debate entre os dois, defensores com o mesmo fervor do credo universalista da razão, somadas as contribuições de Rousseau e Schopenhauer, nasceu uma corrente rica de reflexão sobre direito, ética e moralidade. Kant era radical em seu imperativo moral: em absolutamente todas as situações deve-se falar a verdade. Já Constant, acreditava que por razões, como as filantrópicas, é possível se pensar em um certo direito de mentir. Kant achava que garantir estatuto de racionalidade à mentira era abandonar a civilização em nome da barbárie. Constant apelava para outros valores de civilização para entender a emergência da mentira, em alguns casos, como imperativo de outra forma de justiça.
O que escapa a esse debate hoje é o nível dos debatedores e das verdades e mentiras em jogo. Os filósofos do esclarecimento falavam de um homem reto e de um jogo público afeito às regras e aos contratos. Hoje, nosso horizonte de falsidade foge a todas as regras. O filósofo da mentira é Roberto Jefferson, capaz de se portar como arauto da verdade, apenas porque afirma, com requintes de detalhes, que sua mentira é mais honesta pelo fato de apresentar de forma deslavada.
O resultado social do que a sociedade brasileira vem acompanhando é grave. O desmonte da moralidade da política parece dar operacionalidade à alienação que sempre rondou uma sociedade patrimonialista como a nossa. Num terreno em que os valores públicos se desmancham nas mãos indecentes e concupiscentes dos novos heróis da amoralidade, a credibilidade das instituições vaza pelo ralo. Para quem achava “que todo político é ladrão”, a situação presente não instiga à revolta, mas ao abandono. Como num jogo do já sabido, a corrupção é dada uma variável humana da qual, no máximo, só se pode querer distância."
A polêmica não é nova. Kant e Benjamin Constant travaram um debate sobre o direito de mentir por razões humanitárias, em pleno furacão do iluminismo. Do debate entre os dois, defensores com o mesmo fervor do credo universalista da razão, somadas as contribuições de Rousseau e Schopenhauer, nasceu uma corrente rica de reflexão sobre direito, ética e moralidade. Kant era radical em seu imperativo moral: em absolutamente todas as situações deve-se falar a verdade. Já Constant, acreditava que por razões, como as filantrópicas, é possível se pensar em um certo direito de mentir. Kant achava que garantir estatuto de racionalidade à mentira era abandonar a civilização em nome da barbárie. Constant apelava para outros valores de civilização para entender a emergência da mentira, em alguns casos, como imperativo de outra forma de justiça.
O que escapa a esse debate hoje é o nível dos debatedores e das verdades e mentiras em jogo. Os filósofos do esclarecimento falavam de um homem reto e de um jogo público afeito às regras e aos contratos. Hoje, nosso horizonte de falsidade foge a todas as regras. O filósofo da mentira é Roberto Jefferson, capaz de se portar como arauto da verdade, apenas porque afirma, com requintes de detalhes, que sua mentira é mais honesta pelo fato de apresentar de forma deslavada.
O resultado social do que a sociedade brasileira vem acompanhando é grave. O desmonte da moralidade da política parece dar operacionalidade à alienação que sempre rondou uma sociedade patrimonialista como a nossa. Num terreno em que os valores públicos se desmancham nas mãos indecentes e concupiscentes dos novos heróis da amoralidade, a credibilidade das instituições vaza pelo ralo. Para quem achava “que todo político é ladrão”, a situação presente não instiga à revolta, mas ao abandono. Como num jogo do já sabido, a corrupção é dada uma variável humana da qual, no máximo, só se pode querer distância."
- Ou isso ou a barbárie.
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