Infelizmente, o "povo" hoje está muito mal educado e transformou as salas de exibição em lugar de convescote, ou pic-nic, como se diz: levam-se sacos e mais sacos de pipoca, copos e mais copos de refrigerante, desembrulham-se quilos e mais quilos de balas, chocolates, bombons e pirulitos, além das conversas em voz alta, piadas de mau gosto, etc. Quem nunca passou pela tortura de querer prestar atenção em um filme e ser desconcentrado pela bagunça reinante?
Mas quando se consegue o propício ambiente, não há como se deixar envolver por uma boa trama, uma história bem narrada, música e ruídos realçando sensações desencadeadas pelo desfile de luz e sombra que nos hipnotiza e nos transporta para outra dimensão.
Há, porém, outras utilidades para a tal da "sétima arte", dentre as quais salientarei uma que concerne ao meu campo de trabalho: o ensino da Psiquiatria e da Psicanálise.
Diz-se que "a arte imita a vida", o que muitas vezes é verdade. Afinal, o simbólico surge como fator inaugural da cultura: dizer o indizível, representar os conflitos, os medos, os sonhos... tudo isso compete à arte.
A Psicanálise (pacientes, psicanalistas, conflitos) tem sido tema de inúmeros de filmes. Um casamento nem sempre feliz, pois predominam a caricatura e o simplismo. Veja-se o que diz Cláudio Duque, psiquiatra pernambucano recentemente falecido:
Se "a via régia" para se aproximar do inconsciente são os sonhos, conforme nos ensinou Freud, em A Interpretação dos Sonhos, a analogia destes com o cinema é óbvia. Na sala escura temos a oportunidade de vivenciar emoções mais diversas, intrigantes, assustadoras ou prazerosas, assim como nos sonhos. A "realidade" imaginária do sonhar, onde tudo é possível, em que a aparente lógica do dia-a-dia é totalmente subvertida, o passado e o presente se misturam, tudo isso ocorre nas telas e nos envolve plenamente.
Cito, novamente, Cláudio Duque:
"Não há ação mais penosa da mente do que a invenção. Não obstante, nos sonhos funciona com uma facilidade e uma diligência que não ocorrem quando estamos acordados". (...) "O que desejo destacar é o divino poder da alma de construir a sua própria companhia. Conversa com inumeráveis seres de sua própria criação e se transporta a dez mil cenários de sua própria imaginação. É o seu próprio teatro, seu ator, e seu espectador. Isso me faz recordar o que Plutarco atribui a Heráclito: todo homem acordado habita um mundo comum; porém cada um pensa que habita seu próprio mundo quando dorme (sonha)"(...).
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